Lisboa foi a Capital da Integridade no Desporto e a sede do Comité Olímpico de Portugal o palco para o Workshop Nacional – POINTS (Single Points of Contact for Sports Integrity), que reuniu alguns dos maiores especialistas internacionais ligados ao Comité Olímpico Internacional (COI), ao escritório dos Comités Olímpicos Europeus (COE) na União Europeia (UE), INTERPOL e Polícia Judiciária (PJ), para um dia de trabalho em torno de uma das grandes ameaças da actualidade: a manipulação de competições desportivas.
José Manuel Araújo, Secretário-geral do COP, abriu a sessão alertando para a importância do tema, tratado de modo a permitir “que os atletas estejam cientes dos riscos que correm”, quando em causa estão competições enquadradas no mercado de apostas desportivas. “Fazer um esforço de boa governação e manter as competições íntegras é essencial”, sublinhou José Manuel Araújo.
O vídeo em que o tenista argentino Nicolas Kicker – suspenso pela Unidade de Integridade da Federação Internacional de Ténis por três anos – relata a sua experiência de ter aceitado participar num esquema de manipulação de jogos deu mote às intervenções seguintes, tendo o Director-geral do COP, João Paulo Almeida, apelado à aplicação de “tolerância zero” em casos de manipulação. “Como é que todos podemos fazer melhor para passar das palavras aos actos?” – questionou num momento em que as boas intenções legislativas ainda não passaram a boas práticas.
“Orientação e estratégia do Movimento Olímpico para a Manipulação de Competições Desportivas” deu título à comunicação de Evangelos Alexandrakis (COI e membro da Unidade de prevenção de manipulação de competições do Movimento Olímpico). “Regulação e Legislação; Consciencialização; e Monitorização e Investigação” são os três pilares segundo os quais a Unidade está a actuar num trabalho conducente à integridade no desporto. “Este fenómeno é real e todos nós no Movimento Olímpico temos de actuar” defendeu, exortando à partilha de informação que não deve ficar circunscrita a cada Federação Desportiva.
Alexandrakis considerou ainda o trabalho feito pelo COP, na área da integridade no desporto, como “um modelo inspiracional”, por se tratar de “uma boa prática em termos de activação dos Comités Olímpicos Nacionais, com o apoio às federações e um programa alargado, com muitas acções.”
Valentin Capelli (Escritório dos Comités Olímpicos Europeus na União Europeia), fez a apresentação do programa POINTS, em vigor desde Janeiro de 2028, que “trabalha o desenvolvimento de projectos de boa governação e integridade, e não apenas na manipulação de competições desportivas”, tendo considerado ser fundamental que “as federações passem à prática” na forma como encaram este tema. “É preciso colocar o problema da manipulação de competições ao nível a que é tratado o doping”, defendeu.
Claudio Marinelli (INTERPOL), abordou a Rede de Investigação criada pela INTERPOL e o COI, mas começou por fazer um elogio ao COP: “Trata-se de um dos melhores comités a trabalhar nesta área e não o digo por estar aqui como convidado.”
Na distinção entre “investigações criminais e disciplinares”, Claudio Marinelli defendeu que as duas “podem trabalhar em paralelo. O sucesso depende no reconhecimento e respeito mútuos. Perceber as diferenças ajudará a definir os parâmetros de cooperação. O caminho é estar preparado” para os desafios que a manipulação de competições está a lançar.
Marinelli informou que nesta altura 87 países fazem parte da task force da INTERPOL no combate à manipulação de competições.
As “Boas Práticas” foram tema para a intervenção de Rute Soares (Federação Portuguesa de Futebol), a única Federação em Portugal a ter uma Unidade de Integridade.
Na apresentação de alguns dados, Rute Soares informou que se aposta uma média de 510 mil euros por jogo, em Portugal, mas esse volume aumenta para 35 milhões diários, se for considerado o mercado global.
Rute Soares esclareceu que, em contexto de manipulação de competições, “têm sido os agentes desportivos, os atletas, que estão no fim da pirâmide, a enfrentar julgamentos.” No que diz respeito a boas práticas resumiu que os atletas devem “fazer o seu melhor dentro de campo, não apostar na sua modalidade e reportar” sempre que forem abordados para entrar em esquemas de manipulação.
Seguiu-se uma mesa redonda sobre a Implementação de um Programa de Integridade, com a participação de Valentin Capelli, Rute Soares, José Ribeiro (Polícia Judiciária) e de Claudio Marinelli, que propôs a criação de “um registo central de apostas”. E foi mais longe, quando se comparou a manipulação de competições com o doping. “O problema em relação ao doping é que este segue uma substância e nós não podemos seguir uma substância. Quando muito, podemos tentar seguir o dinheiro.”
José Ribeiro sublinhou que “estamos mais preocupados com os casos nacionais, que os temos. No caso Jogo Duplo, não conseguimos trazer à justiça os principais responsáveis”, sublinhando aquilo que já dissera Rute Soares em relação à base da pirâmide em que está assente a manipulação de competições e o corrompimento das apostas desportivas.
“O movimento associativo tem de ser a primeira linha de defesa do desporto, nós estamos na segunda linha”, considerou José Ribeiro.
João Paulo Almeida assegurou a moderação da mesa redonda, alertando para o fenómeno de marginalização que está a atingir quem assume a denúncia de casos de manipulação: “Quem reporta é que está a sofrer consequências severas.” E deixou um desafio: “Não basta culpar as autoridades e os políticos, é preciso perguntar: o que é que nós já fizemos” para combater um fenómeno que extravasa em muito as fronteiras do desporto e envolve fenómenos tão diversos como o tráfico e é do foro da investigação criminal?
Noutra latitude mas dentro do mesmo tema, João Sousa, Telma Monteiro, Patrícia Mamona, Fernando Pimenta e David Rosa são algumas das “caras olímpicas” que se juntaram à campanha, apresentada no âmbito do Programa de Integridade do comité.
Sobre o desenvolvimento da mesma, o Account Director da Creative Minds, Bruno Firmo, considera que, apesar de ter sido desafiante, conseguiram “criar uma marca transversal a todas as problemáticas vividas no mundo desportivo, assim como inerente a todas a modalidades olímpicas”.
“O resultado é um “naming” que apela à integridade, uma simbologia que diz ‘basta’ à desonestidade e um património gráfico composto pelas delimitações de todas as modalidades, clean e transparente como o desporto deve ser”, concluiu.
A agência de comunicação explicou ainda que, com esta iniciativa, o COP pretende actuar junto dos comités olímpicos nacionais, federações europeias e federações desportivas nacionais, “na formação e capacitação de pontos únicos de contacto para a matéria de integridade, em linha com as principais orientações internacionais e o ordenamento jurídico nacional”.
Sempre na linha da frente desde que foi “chamado” a desenvolver este trabalho em Portugal, de que é pioneiro, o Comité Olímpico de Portugal torna-se o líder das instituições desportivas portuguesas neste âmbito, o que é um papel de largo alcance na procura da verdade desportiva, da ética e da Integridade.